domingo, 27 de setembro de 2015

O meu primeiro BRM - Douro Vinhateiro 200

Olá pessoal

Cá estou eu de novo para vos relatar a minha primeira experiência num BRM - Brevet Randonneur Mondial.
Sempre me apaixonei por relatos de pedaladas de longa distância, quer seja em BTT quer em estrada, e à pouco tempo descobri este grupo de apaixonados por pedaladas longas.
E na página do site nacional dos randonneurs de Portugal, pode ler-se:  

      BRM - ciclismo de longa distância não competitivo
      Esta actividade interessa-lhe?

Quem quiser saber mais é só ir ao link dos randonneurs.
Voltando ao assunto, depois de um ano um pouco irregular, em termos de treinos e de bikes, faltando um objectivo principal para focar e direccionar o treino tal como no passado tinha existido o passeio do Caminho de Santiago, acabando por ir fazendo os meus treininhos um pouco ao sabor da onda, quando havia tempo fazer aqueles treinos junto ao mar, de preferência na ciclovia por causa dos carros. 
De repente surgiu-me esta ideia, e se fosse fazer o último BRM do ano, já que tinha-me inscrito no ano passado, depois não chegou a haver qualquer hipótese de participar e este ano muito menos.
Douro Vinhateiro 200 kms. 
Objectivo interessante, pelas paisagens do Douro, para quem gosta de pedalar e ir fotografando seria um prato cheio de motivos de interesse, fui sondando alguns companheiros, ninguém se foi mostrando receptivo à ideia, mas só isso não era motivo suficiente para desistir da ideia, antes pelo contrário. O tempo muito curto para intensificar o meu deficiente treino, principalmente em subidas já que a minha zona de conforto é rolar em planos, olhei para o objectivo e para o que já tenho feito este ano, poucas longas distâncias ultimamente e a maior delas foi de 160 kms e já tinha sido em Maio um passeio por Guimarães e Braga.
A descrição de Miguel Torga ainda aguçou mais a minha vontade:

"O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso da natureza. Socalcos que são passadas de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor, pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis da visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta." 
Miguel Torga in "Diário XII"
 
O passeio dos randonneurs tem como objectivo percorrer longas distâncias, no caso dos 200 kms, tem como alvo concluir em 13h30, no mínimo a 15 km/h seria possível concluir com êxito. Pensei com o meu capacete, acho que sou capaz e vou tentar.

Dia 26 de Setembro de 2015, pelas 07h00 estava presente no Inatel de Entre os Rios para dar início à minha aventura. Sendo a primeira vez que ia andar com estes companheiros, não conhecia nenhum dos outros companheiros, mas rapidamente se começou a trocar impressões e experiências entre nós, aliás como é hábito na malta das bikes.


Procedeu-se à homologação do equipamento, um randonneur norteia nos seus princípios rolar com a máxima segurança na estrada, obrigando a rolar com um colete refletor de cor verde fluorescente ou laranja, luzes à frente branca e atrás vermelha, não intermitentes, e a bike à vontade do ciclista.
Logo cheguei à conclusão que éramos poucos 10, mas gente batida neste tipo de evento, neste e noutros mais longos, de salientar que este tipo de brevet de 200 kms é o mais curto, depois há de 300, 400, 600 e 1000. E quem consegue terminar uma série de um de cada pode ir fazer a chamada PBP ou seja Paris - Brest - Paris com a distância de 1200 kms. Comigo havia malta que já tinha feito o PBP este ano à cerca de um mês.
Na foto abaixo está o randonneur Jacinto Oliveira, o mais jovem presente com 66 anos (quase 67), com um espírito perfeitamente descontraído e brincalhão.


Depois de uma breve palestra dos organizadores José Ferreira e Manuel Miranda, sobre o percurso sobre os cuidados a ter na estrada com os carros, nomeadamente nesta altura com as vindimas a decorrer, deu-se início à partida 07h30 em ponto.
A manhã estava a começar a clarear mas com um nevoeiro que obrigou a sair com as luzes acesas, pelo sim pelo não. 
Está claro que mal a estrada empinou eu fui ficando para trás, habitual nada de novo, nem eu esperava que fosse de outro modo. Isto é para se fazer sozinho, com os seus próprios meios sem ir na roda de ninguém, pelo que meti o meu ritmo e fui andando por ali acima. os primeiros 40 kms eram quase sempre a subir até os 460 m de altitude, pelo que nem houve tempo para aquecimento e as pernas ainda não tinham aquecido bem e já começavam a levar porrada. Surpresa minha, quando chego ao alto dos tais 40 kms o resto da malta estava quase toda lá parada à minha espera. O José Ferreira veio um algum tempo ao meu lado, conversamos um pouco, uma vez que pouco tempo tinha havido quando chegamos para nos apresentarmos e saber o que eu estava habituado a fazer.
Uma coisa é certa, era opinião de todos com quem fui falando no caminho, era o pior brevet para se fazer primeiro, devido à dureza. Eu sei que por norma não posso suportar andamentos rápidos, e nas subidas ainda menos, fui metendo as minhas desmultiplicações e fui subindo conforme podia e devia.
Entretanto o Douro ia-se avistando e o nevoeiro ia subindo, e a paisagem ia começando a deslumbrar por entre as brumas matinais... 







Rapidamente chegamos a Frende onde estava o primeiro check point. Nós éramos portadores de um cartão onde deveríamos ir registando nos três pontos de controle e a chegada, a hora de passagem e o carimbo do local. Tempo para comer uma bela sande de presunto, repor o electrólito no corpo abastecer os bidões da água e toca a pedalar rumo à Régua.












Chegada ao Peso da Régua, com muito trânsito muita confusão de gentes locais e turistas, a zona junto ao rio estava apinhada de carros e gente nem parei, fui furando até chegar à ponte pedonal onde aí tirei algumas fotos para registar a minha passagem.








Agora rumo ao Pinhão pela estrada 222, considerada a estrada mais bonita do mundo para se conduzir de automóvel...





Entretanto o resto do pessoal foi passando por mim já em direção contrária, sempre incentivando uns mais adiantados que outros, mas como eu ia noutro comboio com mais paragens e mais lento, apenas com o objectivo de chegar ao final.


Chegado ao Pinhão, ir ao Hotel Vintage House, mais propriamente à loja dos vinhos carimbar e ir ai encontro da família que entretanto também estava por lá, não fosse eu às vezes precisar de transporte, mas sentia-me bem, 100 kms estavam completos em cerca de 5h. Mas a tarde ia ser bem mais penosa já que a temperatura ia subindo cerca de 34º







A selfie com o meu filhote e restante familia ao fundo à sombrinha.










Chegado à Régua, tempo de repor os níveis no organismo, uma sande presunto e a cervejinha preta que bem que soube.


Novamente ao caminho e as paisagens da margem sul eram ainda mais deslumbrantes, o que ia animando a percorrer o que faltava.












Aos poucos ia-me aproximando do destino, primeiro Resende onde seria o terceiro check point, mas a distância acumulada nas pernas a somar ao calor que se fazia sentir estavam a começar a fazer-se sentir, já custava mais cada vez que tinha de subir.










O calor era tanto que na passagem vi uma fonte e fui tratar de refrigerar o corpo quase todo, molhei-me bem da cabeça aos pés, soube bem.


Chegada a Resende cerca das 16h45, já ia muito a custo mas decidido a continuar até ao final desse por onde desse. Aqui faltavam cerca de 60 kms, estavam percorridos mais ou menos 150. 
Tempo para re-hidratar e comer algo mais substancial que desse mais força. Até Sagres valeu..





A noite ia chegando e o sol começava a esconder-se melhorando por um lado, mas nesta altura já ia muito desgastado.



Aqui já não havia muita "panchorra" .. Ponte da Panchorra





Até que cheguei à subida para Cinfães, já esgotado, fiz grande parte dessa subida a pé e a ficar um pouco desmoralizado, mas tinha de continuar. Guardei a câmara no alforge, e preparei para enfrentar a noite e o frio, luzes ligadas e pouco depois era noite cerrada. 
Estes últimos kms foram penosos parece que nunca mais passavam, sempre que olhava para o gps na esperança que ele me dissesse " ..estás quase" e se nas descidas ficava gelado com o vento, nas subidas voltava a aquecer e a transpirar. Até que finalmente atingi a rotunda que dava acesso à ponte nova de Entre os Rios, não podia circular ali mas sabia que estava quase a chegar, faltava uma subida final até Castelo de Paiva e depois descer até ao rio, atravessar a outra ponte onde podemos circular com a bicicleta.  A ansiedade começava também a apoderar-se de mim cada vez que olhava para as horas e via a hora limite a chegar rapidamente. Para cumulo a minha família preocupada, naturalmente devido a ser de noite, ligava volta e meia para o tlm, obrigando-me a parar já que trazia tudo no alforge.
Assim que me apanhei na ponte respirei de alívio .. "está quase" .. faltavam menos de 3kms a subir, onde fui dando tudo o que restava para chegar finalmente a Inatel.
Com todos à minha espera na entrada, deram-me os parabéns por ter concluído e fomos jantar todos.
Digamos que passei um dos melhores dias de sempre na minha vida de ciclista, quebrando algumas barreiras pessoais, desafiando os meus limites e saindo da minha zona de conforto. Nunca tinha feito tantos kms seguidos e tanto tempo e com tanto acumulado de subida. Sabia que ia ser duro e difícil mas consegui terminar.
Segui-se um belo jantar de cabrito assado na Casa das Lampreias onde se pode conviver mais um pouco com a maior parte dos participantes, a sempre interessante troca de impressões e experiências.
 
Pelos dados do Strava foram 215 kms, 4156 m de acumulado de subidas e em 11h 46 min, tempo em movimento, tempo total chegou às 13 h desde que saímos.
Claro que no acumulado de subidas varia um pouco de site para site, se no Strava deu mais de 4000 no Garmin Connect não chega aos 3000, fosse como fosse ... foi duro, mas consegui ...



Antes de ter saído hesitei bastante se devia levar os alforges, ou mochila. Talvez tenha ido um pouco mais pesado mas não me arrependo, levei bastante "comida" na forma de barras energéticas e geis para ir dando força e moral, não chegando a comer nenhuma barra, abusei e de que forma dos geis e penso que fiz bem, parando quando possível para comer algo mais substancial, no caso foram 3 sandes de presunto, compal e duas cervejinhas pretas, para além dos cafés com açúcar qb.
 
Até uma próxima aventura e boas pedaladas e como dizem os randonneurs 
Até breve(t) ...


8 comentários :

  1. Muitos Parabéns!
    Fotos lindas e descrição excelente :)

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  2. Parabéns desde o Brasil amigo. Quero muito fazer esse pedal quando for a Portugal. Seria possível você me passar o trajeto GPX para eu poder colocar no meu Garmin e seguir esse trajeto? Abraço

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    1. Obrigado José Fonseca e aqui vai o link de um site de onde pode descarregar o track gps
      http://pt.wikiloc.com/wikiloc/view.do?id=10969281
      se por acaso não conseguir descarregar dali mande-me uma msg com o teu email que eu envio-te o track diretamente

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  3. Muitos parabéns pela aventura e coragem!!! Também ando a ver se me inicio num BRM, e pelas fotos fiquei com muita vontade, boas pedaladas.

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    1. Obrigado e força para se iniciar como randonneur .. abraço

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